segunda-feira, 5 de junho de 2017

Hoje vou ouvir sobre catedrais com Stella Junia

Segue abaixo o discurso da querida profª Stella Junia Ribeiro – professora e compositora – paraninfa da turma de Música Sacra do Seminário do Sul/STBSB, em 2005. Lindo, sobre a Catedral de dentro ou Encontrando Deus no quintal
.
Caro reitor, coordenador do curso, colegas professores,
senhores e senhoras presentes, queridíssimos alunos formandos,
Hoje vou falar de catedrais...
Edificações fundamentais na vida de qualquer ser humano.
Falarei da sua importância, dos materiais para construção (para fundações e acabamentos), e depois das dicas para construção, darei sugestões para seu funcionamento, seus serviços e suas rotinas.

Pretendo partir da minha própria experiência.
Então, na verdade são experiências de construção da minha catedral que eu vou compartilhar, isso é bem diferente do que seria uma aula técnica para construções e edificações. Ah, é bom ressaltar algumas características dessa catedral:


1. Ela não cresce para cima e para fora. Ela cresce para dentro e para baixo.

2. Não tenta alcançar o céu em torres magníficas, mas ela cria raízes profundas.

3. Não é espaço para multidões. É lugar de solidão.

4. Os eventos não obedecem a agendas ou horários, aliás, quanto mais profunda a catedral, mais intensos serão os serviços, podem durar as 24hs do dia.

5. Nada de coral ou grupos instrumentais. É música sem som, performance sem movimento. 

6. Fala também não tem. Até porque a lei que impera nessa catedral é a lei do SILÊNCIO. Mas, mesmo sem fala e pregação, posso aprender a cada minuto do meu dia.

7. Sem introdutores ou equipes de relações públicas. Estarei sempre em casa, e na minha casa não preciso de ninguém que me diga onde sentar. Sei que sou bem-vinda sempre.

8. Sem diáconos, ou servos. Eu mesma me sirvo, pois a mesa está posta 24hs por dia.
Só não me saciarei se não quiser.

9. Nada de profecias e pretensos intermediários: minha fala

A mística do encontro com Deus precisa da catedral de dentro, da edificação da alma, que se constrói no silêncio e na solidão. As grandes assembleias, dos templos de fora, falam em Deus, cantam de Deus, cultivam a relação entre as pessoas (e isso tudo é muito bom), mas eu tenho encontrado Deus no silêncio. E eu só consigo silêncio na solidão.
Esse lugar maravilhoso e misterioso que eu cultivo como se fosse um templo para dentro de mim, onde só eu entro e Deus está lá, me aguardando sempre, e no nosso silêncio nos encontramos.

Queridos, num mundo onde ouvimos tantas falas, tantos sons, tantos modelos de templos para fora, isso de repente gera confusão e uma perplexidade grande.
Eu corro para dentro. Desço os degraus da minha alma, e cada descida é mais profunda que a anterior. E Deus fala a mim. Como fala a ninguém mais, pois Ele sabe o meu nome, os meus pensamentos, conhece cada passo da minha vida e o trato dEle comigo é pessoal.

Para além das gestões, das harmonias todas, funcionais ou não, das percepções, das monografias, das performances musicais, das teologias e estéticas, o que manterá vcs, nos templos de fora, nas universidades, nos magistérios escolares, é a construção da catedral de dentro.

Essa é uma obra que nunca acaba. E quanto mais avança é sempre para dentro, para o fundo da nossa alma. É nessa catedral que eu me encontro, que aprendo a aceitar as surpresas da vida, nem sempre boas, que me consolo, que me  reanimo, que me percebo, que me entendo, que contemplo absolutamente fascinada e perplexa o quanto Deus me ama, a ponto de ser Deus comigo, Deus em mim, e poder encontrá-lo na nossa "catedral de dentro", e lá ouvi-lo, sentir o seu amor INCONDICIONAL, e viver experiências absolutamente pessoais e intransferíveis.
Se chegarmos a este ponto, nada nos confundirá, nem nos decepcionará, nenhum escândalo nos abalará, pois saberemos em quem temos crido, e essa experiência, se alguém quiser questionar ou invalidar, nós saberemos o quanto vale, pois será fruto da nossa vivência com Ele, Emanuel, Deus conosco, Deus em nós.

Bom, de resto, ou como disse Jesus "as outras coisas", todas continuam a acontecer, pois "O rio correrá para o mar e nada deterá o seu curso". Muitos aqui terão seus filhos, construirão suas famílias, terão ministérios eficazes, serão grandes professores, grandes instrumentistas, com dores e prazeres, porque a vida é esse “caldo” todo mesmo. Mas o sentido virá sempre de dentro, do tempo que você gasta para dentro, na edificação de dentro.

E muito a propósito, gostaria de ler um poema de Emily Dickinson (1830-86):


“Alguns guardam o Domingo indo à Igreja -
Eu o guardo ficando em casa
tendo um Sabiá como cantor
e um Pomar por Santuário.
- Alguns guardam o Domingo em vestes brancas
mas eu só uso minhas Asas
E ao invés do repicar dos sinos na Igreja
nosso pássaro canta na palmeira.
É Deus que está pregando, pregador admirável
e o seu sermão é sempre curto.

Assim, ao invés de chegar ao Céu, só no final
eu o encontro o tempo todo no quintal. “


Peço permissão aos presentes, para dedicar esse momento à  memória de Joselita Guimarães Ribeiro, minha mãe: figura silenciosa, discreta, misteriosa, cuja prioridade em vida era ir para o templo de dentro e seu maior desejo era permanecer no silêncio de Deus. Agora ela realizou o seu desejo, para além do eterno, e sei que ao invés de perguntas teológicas e curiosidades outras, ela deve estar apenas contemplando silenciosamente .
Aquele que foi o seu maior amor em vida: Jesus.
obrigada.
Stella Junia Ribeiro

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